Folha que cai, resquícios de um tempo
Não adiantava.
Poderia tentar se segurar mais uma vez, mas não adiantava.
O vento soprava-lhe o peito com tanta força que ela percebera.
Era chegada a hora.
Nos seus anos de folha, todos haviam lhe contado que o fim seria esse.
Um galho seco. Um elo desfeito. E um voo para o chão.
E lá se foi ela.
Bailando pra lá e pra cá.
Pra lá e pra cá...
Mas o que ninguém contara era o percurso.
Estava ela, uma folhinha atrevida tentando voar diferente, ainda que às folhas, em seu fim, só coubessem o aceite de cair, murchar, secar e sumir.
Por um instante ela jurara sentir que um lindo bailarino tomara-lhe os braços para uma última dança.
Aceitou sem pestanejar e lá se foi.
A plateia se fazia presente. O sol brilhava como nunca e olhá-lo ao cair era ainda mais ofuscante. Mais parecia que seus raios a abraçavam para proteger-lhe da futura queda.
Foi então que ela pois-se a relembrar.
Das brincadeiras com as outras folhinhas quando criança; Daqueles frutos pesados que mais pareciam quererem levá-las mais cedo ao chão.
E lembrara que as folhas adultas diziam que uma folha cai porque não mais trabalha com eficiência. Apresenta manchas e não embeleza.
Foi então que decidiu:
- Cairei de pé.
- Fui obrigada a filtrar o ar indigesto de Guerras, Ditaduras e Democracias descaradas.
- Ajudei a fazer sombra para desabrigados e casais apaixonados que em minha árvore se encostavam.
Continuava a sentir sua queda, mais e mais. E via todos aqueles que a olhavam...
Fora fustigada por uma pergunta inquietante: o que sobra a uma sobra como ela?
Seu corpo só caííía.
Pensa. Pensa. Pensa. Rápido!
Fechou os olhos. Agarrou o abraço do sol e aceitou aquela dança.
Faltavam-lhe poucos segundos.
Já podia sentir o frio do chão.
Foi então que avistou uma senhorinha sentada no banco daquela antiga praça.
Ela lia um livro surrado. De folhas
amareladas.
E elas se olharam.
Antes que a folhinha encontrasse a
resposta, acabara repousando sobre o livro.
E como aquelas palavras lhe faziam bem...
A velhinha enxugou a folha.
Sentiu seu cheiro.
Já eram 17 horas.
Interrompeu a leitura de uma das centenas de cartas escritas pelo seu marido, morto há trinta anos.
E lá a folhinha ficou.
Sobrando àquelas duas velhas apenas um
doce sentimento de amor.
Por Natália Freitas
Comentários
Postar um comentário