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Tá tudo amassado

Os silêncios lá fora não são ouvidos. Automóveis soam normalidade. A quem querem enganar? Tá, não precisa dizer. Não são só eles.  Certo? Todo dia um pouquinho mais. Os pratos já lavei. A cama arrumei.  As plantas nunca estiveram tão bem hidratadas e verdinhas. Estou limpa e alimentada todos os dias às 07h. E cadê meu silêncio? Antes disso tudo acontecer, eu conversava comigo e pedia tempo. Desejava pelo tempo. Onde nele eu pudesse respirar. Pensar. A vida não era minha. Eu sabia disso. E ardia o desejo de tê-la um dia. Dia. "Tempo que transcorre, em determinada região da Terra, entre o instante do nascer do Sol e do seu ocaso". Pesquisei no dicionário. Olho pela janela hoje e ele me parece um não sei o quê. Igual ao lençol que pela manhã eu amasso e guardo sem dobrar. Teve um dia em que acordei otimista. Mudei de lugar os objetos da sala. E pratiquei exercícios e também dancei. Na sala de novos ares.  Olhei pro alto. O qu

Em relevo

Calma sensação perturbadora de paz. Faria sentido pra ela? Pensara só por uns instantes. Os olhos mal abriram e aquilo lá nela. Vinha a se preparar para a guerra. Para os dias estranhos que teimavam em permanecer. Para o caos ordenado. Para aquela música de um Ipiranga nada plácido. Mas não para a paz. Dela até enternecia pensar. Só que não vinha. Suava. Custava. E não vinha. Havia corrido tanto do ódio que desaprendera sobre amor. Era possível? Só agora, abrindo os olhos, percebera. Que também ela estava em bombardeios. As costas lhe pesavam a rotina do (des)padrão. Continuava aguerrida. Ela sabia. Mas lhe doía buscar todo dia o colorido no cinza. Esgotado estava seu corpo. E do espírito não tinha certeza se ainda lhe havia. Mas era soldada. Repetia todo dia. Sua mãe foi. Outras também. E um NÃO rejeitava o tudo posto. NÃO. NÃO podia ser esse seu destino. Nem o das outras. Afinal, Deus, elas eram força. Sabiam. Mas não queriam. O corpo novamente

Ecos

Para pensar é preciso desembarulhar. Volta e meia, me pego assim, lotada de vozes inquilinas. E me reconheço apátrida de mim. Fazem tanta zuada elas. Ouvem músicas de que não gosto e sem fone de ouvidos. E me assusta. Ele. O silêncio. No meu medo, também o imagino cheiroso, sorridente. Bom de abraçar e chamar para um café. Do meu silêncio ainda não sei. Anteotem até pedi ao mundo para falar mais baixo. Ou até mesmo dormir um pouco. Não me obedeceu. Imagina só: Eu ficaria com a praia vazia e as ondas a chacoalhar. Haveria uma rua. Um cachorro também. Sobre um banco, um livro aberto naquela página abandonada há tempos. E sentaríamos. E conversaríamos. Eu e o silêncio. Por Natália Freitas

(des)veneno

Extraviada via Estragada E o viado lia Normas de inconduta Ia a contragosto E de resto o gozo uma puta raiz anal(isar)

Obedeça

Vá embora se não conseguir lidar com minha chatice E meus cabelos inequivocamente lindos Se não souber me abraçar quando eu tentar fazer de você meu ninho Vá se não entender minha fúria nos dias turvos Se não conseguir ler a mim, poesia dadaísta Bata a porta se eu continuar sendo mais do que você suporta Mude de calçada quando me vir e suas mãos anunciarem seu permanente amor Desligue seu celular. Ele também sabe pra quem você quer ligar Jogue fora aquela carta que não te escrevi. Você não a entenderia Me arranque dos seus sonhos se puder E esqueça que seu melhor sorriso já fui eu Não levante hoje buscando meu rosto preguiçoso Engana-se! Seu lugar nunca foi dentro de mim Abandone o desejo daquele filme que veríamos esse sábado Fique sem graça quando nossos amigos te disserem "vacilão" Porque é precisamente isso! Eu daqui farei o mesmo Já troquei os lençóis e aquela almofada sua de lugar Uma nova playlist. E novo lugar na cama E sabe sua camisa preferi

Bem de altitude

Aprendi a voar desde muito cedo. E, de tempos em tempos, preciso me puxar pelos pés. Por vezes esqueço, e me dano a subir, subir, subir. Por Natália Freitas

Língua

Mulher, substantivo que bem poderia ser verbo. Ou advérbio de intensidade. Para ambos, mulher seria signo para dizer sobre aquilo que é vívido, nobre, intenso, exemplo, voraz, doce, sábio, belo. Mulher movimento, mulher ação. Qualidade de ser mulher. "Mulheriei o dia e ele me mulheriou de volta" "Estudei mulhermente hoje" "Mulheriaram Paris num só gole " Na próxima reforma linguística, irei pessoalmente reivindicar tal inclusão. Que, de tão digna, vai deixar as aulas de português mais mulher. Poetas terão um novo recurso para materializar em letras a explosão de sentimentos ainda sem título. Mulheriemos! Por Natália Freitas